Lesões Ortopédicas Relacionadas ao SARS-CoV-2
Após mais de um ano da pandemia do novo coronavírus conseguimos desenvolver vacinas, entender o mecanismo de transmissão, avaliar melhor o comprometimento respiratório e estabelecer alguns tratamentos. Apesar disso, ainda existem muitas dúvidas referentes ao acometimento musculoesquelético da Covid-19.
Os artigos que apontam as alterações ortopédicas relacionadas ao vírus ainda são escassos, por isso, muito do que sabemos vem da experiência dos profissionais da linha de frente. Sabemos que na fase aguda da infecção (primeiras duas semanas) a pessoa contaminada pelo SARS-CoV-2 pode se queixar de dor articular, cansaço nos membros, inchaço nas articulações e dor muscular. No entanto, essas manifestações são comuns em diversas outras infecções virais.
Diferentemente das manifestações agudas, as lesões musculoesqueléticas tardias são mais frequentes nos pacientes que tiveram casos mais graves, que ficaram intubados e acamados por longos períodos. Essa é a razão de haver uma explosão de manifestações ortopédicas crônicas no atual momento da pandemia em que vivemos.
Esses pacientes permanecem por longos períodos acamados, sem mobilizar adequadamente os membros, algumas vezes na posição de bruços (para melhorar a respiração) e recebem altas doses de corticoides para conter a “tempestade inflamatória” ocasionada pela doença. O imobilismo prolongado faz com que o organismo reserve o cálcio dos ossos para outras funções mais importantes naquele momento. Por isso é comum os pacientes evoluírem com osteopenia e osteoporose.
Além disso, a falta de contração muscular ativa dos pacientes sedados faz com que ocorra grande perda de força e atrofia muscular. Estudos recentes afirmam que 88% dos pacientes com casos graves de Covid-19 tiveram alguma alteração dos nervos e 19% tiveram fraqueza muscular.
A fraqueza muscular faz com que as articulações fiquem desequilibradas, rígidas e evoluam com dores crônicas devido a formação de fibrose e calcificação nos ligamentos. É comum esses pacientes não conseguirem elevar os braços da mesma forma como faziam antes da internação e podem permanecer mancando por meses após a cura da doença. Essa perda de massa muscular também pode ser causada pelo uso dos corticoides ou por uma alteração dos nervos.
As lesões dos nervos associadas à Covid-19 podem ser por ação direta do vírus, pela grande reação inflamatória gerada pela infecção ou até mesmo por microtromboses que ocorrem nos vasos sanguíneos. Alguns pacientes apresentam neuropatias que se manifestam com a perda de força, perda de sensibilidade, alterações de movimento e dor desproporcional nos membros.
O próprio tratamento que é necessário para manter o paciente vivo pode causar danos ortopédicos. É o caso do uso dos corticoides, que são imprescindíveis no controle do dano nos pulmões e podem favorecer o surgimento de infartos e necroses nos ossos (fêmur, úmero e etc). Além dessas medicações, muitas outras que estão sendo testadas e usadas no combate dessa doença ainda não possuem um acompanhamento prolongado a fim de ser possível estabelecer os efeitos colaterais no sistema musculoesquelético. De qualquer forma, em um momento crítico, os riscos e benefícios são pesados e o uso pode ser justificado.
Infelizmente, ainda sabemos pouco e provavelmente novos distúrbios associados ao novo coronavírus serão identificados no futuro. Mas cada vez mais os ortopedistas, fisiatras e fisioterapeutas aprendem a lidar com as lesões osteomusculares da Covid-19 a fim de dar qualidade de vida e conforto aos pacientes vencedores dessa batalha. Caso você tenha tido a doença e tenha algum desconforto na coluna e nos membros, procure um ortopedista.
João Manoel Fonseca Filho
Ortopedista